quarta-feira, 12 de maio de 2010

Trilogia das Cores - A liberdade é azul



Análise das personagens

O filme A liberdade é azul apresenta poucos personagens importantes para a construção da narrativa: Julie – a protagonista, sua mãe, seu falecido marido (Patrice) e a sua falecida filha (Anna), o amigo do marido (Olivier), a amante, e a nova vizinha; e esses passam muito poucas informações a respeito de suas personalidades.
Julie quer ser aceita num grupo social, ou simplesmente ser importante na vida de alguém, e descobre isso logo após o acidente que lhe tirou a família. Sem eles, Julie sente-se deslocada. Ela procura por um elo próximo, no caso, sua mãe, mas essa já não reconhece a própria filha. Com essa rejeição, ela vai procurar o amigo do marido, Olivier, que diz que a ama, entretanto, ele se mostra mais preocupado com a finalização do concerto para a grande festa da Europa do que com as vontades de Julie, como por exemplo, de abandonar a composição de Patrice, que era um famoso compositor.
Julie era apenas uma sombra do marido, ela o ajudava a compor e nunca foi reconhecida por isso. A aflição ainda se agrava quando Julie descobre que Patrice a traía com uma advogada, a qual espera um filho dele. Seu marido amava a amante, e com isso, a esposa fiel se vê de forma menos importante, até mesmo dentro de sua própria família.
Julie só consegue se sentir livre embaixo da água, no completo azul. A piscina vira seu refúgio para escapar de sua solidão existencial, do que acontece no mundo exterior, visto que a personagem não consegue enfrentar seus problemas de frente, evitando assim qualquer tipo de transtorno que possa lhe afligir futuramente.
A protagonista da história se mostra dona de uma personalidade dividida, pois ao mesmo tempo em que procura por um ciclo social, ela foge do mesmo, mantendo relações superficiais. O que fica claro quando a personagem encontra em sua mãe uma fuga para conversar, pois sabe que a mesma não irá lembrar-se dos diálogos ocorridos.
Essa característica da personalidade de Julie monta o ritmo e o andamento do filme. Como não há muitos diálogos, o autor se utiliza de certos elementos que irão guiar Julie a tomar e/ou pensar em alguma decisão concreta para sua vida, como por exemplo, quando sua mãe lhe diz que não se deve renunciar ao nada, ou ainda, quando o flautista da rua diz que devemos nos prender a algo.
E é essa personagem vazia e angustiada, quem constrói a funcionalidade da história. É a partir dela que vamos ligar os fatos e compreender a mensagem que o filme nos apresenta.
“[...]Ela é claramente distinta e hierarquizada como a personagem principal, mesmo sem o acréscimo de nenhum comentário explícito” (Yves Reuter).
Contudo, o filme não se passa apenas pelo olhar da personagem principal, como podemos perceber na cena em que Olivier está vendo as coisas do arquivo pessoal de Patrice no carro, o espectador fica sabendo antes de Julie que seu marido tinha uma amante, ou pelo menos, é o que se imagina pelo contexto das fotos exibidas.
Julie tenta não exteriorizar a dor que sente pela perda do marido e da filha, e para isso se desfaz de todos os objetos que pertenceram a sua família, tentando assim, apagar o seu passado. “Trata-se de desfazer o espaço, tanto quanto a história, a intriga ou a ação” (Deleuze).
A mesma música é tocada diversas vezes em ritmos variados, o que exalta a memória do falecido marido e desencadeia a continuidade do filme, mostrando que alguma coisa está sendo feita, e que ainda há alguma esperança.
Enfim, o filme se dá pela falta de alguma perspectiva na vida de Julie, e que ainda a motiva a viver.